Luxo na Simplicidade – Nem todos nos podemos dar ao luxo de ter uma vida simples. Isso é para quem não tem contas para pagar, não parece?
A era de luxo decadente “à Trump”, não só enjoa – tanto pela sua saturação como pelas razões éticas de ostentar tanto em prol de algo tão superficial, – como é considerado foleiro, mesmo por aqueles que não se importam em ostentar uma vida “luxuosa”. Hoje em dia “luxo” não é mais uma abundância quase claustrofóbica de excessos concentrados, como ter o nosso próprio arranha-céus com o nosso nome em letras de ouro com 4 metros de altura.
Luxo é o objeto simples e indispensável, é a tecnologia que nos facilita a vida mas que não chateia a vista, é ter os confortos da vida a que o séc.XXI nos habituou de uma forma simples, descomplicada e natural. Hoje, luxo e glamour é o natural, a comida biológica, o fairtrade.
É engraçado que precisámos de viver num mundo de excesso e de consumo extremo para perceber o luxo que é a simplicidade. É elegante, para não dizer ético e ecológico, e faz-nos sentir bem saber que podemos ter todos os luxos e confortos sem o sentimento de culpa do preço que a Terra, e outros seres humanos, terão pago para que nós possamos gozar de tais confortos.
Quando se fala em viver em harmonia com a Natureza, ainda apela a muitas pessoas à velha ideia de viver com muitas dificuldades e pobreza, como os nossos avós, ou associar à distopia dos “grupo de hippies malcheirosos”.A verdade é que disciplinas como a permacultura procuram soluções económicas, ecológicas, e integradas com as necessidades e conforto necessários para o nosso bem-estar. E isso inclui o um duche de água bem quentinha no final de um longo dia.
E se eu te dissesse que podes ter o luxo de ter água quente sem precisar de gastar gás natural da botija? De facto, se já fazes compostagem, já tens uma fonte de calor inestimável que, com este sistema que te vamos mostrar, podes utilizar para aquecer água para um belo duche de composto!
Sim, leste bem. Estou a falar de luxo, e agora estou a falar que existe tal coisa como um duche de composto.
Se te arrepiaste um bocadinho quando juntei as palavras “duche” e “composto”, não fujas ainda – vai tudo fazer sentido.
No projeto Agro-Ecológico da Aldeia do Vale, onde tirámos o nosso Certificado de Design de Permacultura, conhecemos imensas pessoas, projetos e ideias fantásticas que revolvem em torno de um estilo de vida menos dependente do consumo excessivo e claustrofóbico, e mais livre e ecológico.
Estivémos lá durante 14 dias. Éramos cerca de 20 pessoas. E todos nós usufruímos de duches bem quetinhos, diários, aquecidos por uma pilha de composto – não só a água vinha a tais temperaturas que bastava ligar um pouco da água quente para temperar a água fria, como nunca foi necessário trocar a pilha de composto para que continuássemos a usufruir de água quente.
Quanto é que isso teria custado se tivesse sido fornecido através do uso de gás natural? Obrigado ao Mestre Coy por ter tudo explicadinho neste artigo.
De facto, uma pilha de composto deve ser vigiada (principalmente se é composto para a horta) para que não ultrapasse os 60C e não mate os micro organismos que queremos numa pilha de composto de qualidade.
Toda essa actividade dentro da pilha de composto é o que produz todo o calor que queremos aproveitar.
Para isso, a água vem da sua fonte – no caso da Aldeia do Vale, uma nascente – e um tubo leva a água para dentro da pilha de composto. O tubo no interior da pilha está disposto numa serpentina que, quando cheia de água, age como uma caldeira armazenando o máximo de água possível enquanto o calor do composto a aquece. Ui, e se a aquece.
Esse tubo sai pelo fundo da pilha e encaminha a água diretamente para o chuveiro.
Para um projeto de sucesso, há que ter em conta a pilha de composto, o sistema de canalização, e a pressão de água. Na Aldeia do Vale, o tanque e a pilha foram colocados num local elevado numa tentativa de criar pressão de água suficiente para o chuveiro usando apenas a força da gravidade, mas por falta de altura para criar a pressão necessária, tornou-se mais vantajoso adicionar uma pequena bomba.
Como permacultura trata de fechar ciclos, não faz sentido investir em, por exemplo, gás natural – um combustível fóssil (e nada barato) – para aquecer água, quando existe uma pilha de composto que agora, não só irá contribuir para um solo mais fértil e maior quantidade e qualidade da comida da tua horta, como está também a criar energia térmica que, aproveitada, contribui para a tua carteira, bem-estar, higiene, e conforto – e ainda reduz a tua pegada ecológica.
Isto é que é luxo.